O dentista que construiu uma réplica de Ferrari F40 no quintal de casa e teve o protótipo apreendido pela polícia venceu a disputa judicial travada contra a marca italiana, que o acusava de falsificação. Segundo decisão do Tribunal de Justiça de São Paulo, o processo contra José Vítor Estevam de Siqueira foi extinto por descumprimento de prazo legal.
No dia 22 de janeiro do ano passado, o modelo artesanal feito por Siqueira foi levado por policiais da casa onde mora, em Cachoeira Paulista, a 201 km de São Paulo, e deixado no pátio da Polícia Civil de Lorena. Na época, a Secretaria da Segurança Pública de São Paulo informou terem sido apontados crimes de desrespeito a registro de marca e concorrência desleal, após investigação iniciada a pedido da própria Ferrari.
O dentista chegou a anunciar a venda do modelo na internet por R$ 80 mil. Na ocasião, ele disse ter ficado em dificuldades financeiras e colocou o veículo a venda para repor os custos com a construção. Ao ter a sua “Ferrari” apreendida, entrou na Justiça com pedido de indenização. A empresa, na época, não quis comentar o caso e disse que só se manifestaria nos autos do processo.
Agora, o Tribunal de Justiça de São Paulo considerou a ação extinta. “Diante da ocorrência da decadência, declaro extinta a punibilidade do (a) acusado (a) José Vitor Estevam de Siqueira”, decidiu a juíza Juliana Guimarães Ornellas, no dia 16 de janeiro, com base no art. 107 do Código Penal. De acordo com a assessoria do TJ, a decadência ocorre quando a parte interessada não cumpre o prazo legal para o exercício de seu direito e não pode mais exercê-lo. A representação da marca italiana no Brasil foi procurada e não retornou até o fechamento da reportagem.
Para o advogado de Siqueira, o “amadorismo” do trabalho indica que ele não tinha nenhuma intenção comercial com o protótipo. “Um cliente da marca original Ferrari em nenhum momento buscaria um protótipo da forma tão amadora como ele fez. A conduta que o meu cliente teve nada tem a ver com a conduta que a ele foi imputada”, afirma João Guilherme Cardoso de Oliveira.
Com a decisão judicial, a defesa fez o pedido para devolução do veículo. Nele, Siqueira utilizou carroceria de fibra de vidro, peças de veículos batidos adquiridas em leilões e motor com componentes reaproveitados de um Toyota Camry 1997. Tudo para tentar imitar uma F40 ano 1987 vermelha. Além da solicitação, também há uma ação por dano moral e material em que Siqueira pede R$ 4 milhões de indenização. De acordo com a defesa, o valor inicial era de R$ 100 mil, mas foi revisto pelo dentista.
“Por ter sido exposto em alguns meios de comunicação, e ele sendo profissional liberal, depende da boa referência do seu nome. Em grande monta, foi um prejuízo que causou a ele uma ficha de pessoa investigada pelo processo penal. Diferentemente do que se imagina e do que a própria legislação prevê, o julgamento social daqueles que observam o investigado é julgá-lo presumidamente culpado”, afirma Oliveira, que disse ter considerado também a capacidade financeira da Ferrari para estipular o valor da indenização.
O dentista comemorou dizendo estar muito “feliz” com a reviravolta judicial e citou prejuízos financeiros que, segundo ele, foram resultados da apreensão equivocada do seu protótipo. “Esse processo vinculou minha imagem de dentista à imagem de um falsificador. Estou desempregado há um ano, pois toda clínica que me candidatava a vaga de dentista, na hora da entrevista me reconheciam vinculando minha imagem ao processo. Sempre ouvia que não poderia ser contratado, pois, vincular a clínica com uma imagem negativa de um falsificador não seria bom para empresa e que era para eu resolver a situação judicial primeiro”, comentou.
Siqueira espera ter sua Ferrari de volta em breve para poder continuar o trabalho de montagem. “Com o carro em mãos, acredito que poderei terminá-lo e realizar o sonho”.